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Infectados

  • Foto do escritor: Antonio Augusto Brito
    Antonio Augusto Brito
  • 20 de out. de 2017
  • 2 min de leitura

curta botafogo infectados

Eu estava errado.

O maldito vício da nova era me forçou a isso.

Mal entrei na Caixa, ali na Nelson Mandela, onde fora resolver umas coisas, e já saquei o celular do bolso.

Dei mole. Deveria ter levado um livro – afinal, a espera pelo atendimento seria dolorosa.

Como sempre.

No entanto, eu já estava lendo as mensagens dos grupos do Whatsapp; curtindo coisas no Instagram; descobrindo que o ministro Gilmar Mendes afirma trabalhar muito, mas não considera isso um trabalho escravo.

Tadinho dele.

– Amigo, dá pra guardar o celular? É proibido usar aqui – me interrompe o segurança.

– Ah, claro! Desculpa. Eu me distraí e esqueci...

Ele estava coberto de razão.

Guardei, e o segurança voltou para o lugar que ocupava outrora.

Importante dizer: ele estava exatamente na minha reta, na parede no fundo da agência.

Passados uns dois minutos, percebo que um homem, sentado na cadeira na frente da minha, mexe no celular como se o amanhã jamais fosse chegar.

Era impossível o segurança não tê-lo visto antes!

Ah, bicho... Eu meti a mão no bolso na hora e voltei a apertar qualquer coisa no meu aparelho.

– Já não falei pra guardar isso? – diz o homem fardado, caminhando pesadamente em minha direção, falando mais alto e mais rispidamente do que da primeira vez.

– Só vou guardar quando ele guardar – respondi calmamente, sem tirar os olhos do meu celular, indicando com a cabeça o homem que se viciava à minha frente.

O segurança permaneceu parado ao meu lado por uns cinco segundos.

Resolvi fitá-lo nos olhos.

Pessoas mais próximas presenciaram a cena.

– O senhor poderia guardar o telefone? É proibido usar aqui, mas tem gente que ainda não entendeu isso - pediu, educadamente, o segurança ao homem. E olhou pra minha cara na frase final.

– É. Tem gente que não entendeu um monte de coisa também – devolvi.

O segurança – negro – fez cara de putinho.

O cara – branco – guardou o celular numa boa.

E eu, depois de atendido, catei meus papéis e fui embora.

Tinha coisa mais importante pra resolver: meu celular já estava quase sem bateria.

* Marcos Luca Valentim é jornalista, cronista e poeta

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