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Vermelho e verde

  • Foto do escritor: Antonio Augusto Brito
    Antonio Augusto Brito
  • 21 de set. de 2017
  • 2 min de leitura

curta botafogo

Pra quem leva a sério as nuances do horóscopo, Sávio é Aquário.

Com ascendente em Aquário.

E lua em Aquário.

Eu não me atenho às questões dos cosmos – mal sei identificar a Ursa Maior, e toda estrela brilhando um pouco mais forte no céu eu digo que é Marte –, mas parece que o sujeito cujo signo é Aquário padece de constantes síncopes de distanciamento da realidade.

Vulgo "desligadão".

Palavra, aliás, que calça com exatidão tudo o que envolve o Sávio.

Imaginem vocês que, aos 22 anos, o rapaz já conseguiu a proeza de virar na Rua São João Batista, seguir reto e ir parar dentro do cemitério.

Assim, lá pra dentro mesmo.

Tudo porque queria ir ao Prezunic, que fica na esquina, mas mergulhou nas distrações do celular e foi ter com os idos.

Que momento.

Ontem, Sávio saiu cedo de casa sob a alegação de que ia para a faculdade.

Estuda Matemática na UFRJ.

A verdade é que a mãe não viu, e nem teria como ver, pois o único vestígio a denunciar o real destino do jovem estava por baixo da calça: a sunga.

Muito calor para lidar com Bhaskaras da vida.

O voo solo começou no metrô de Botafogo, plataforma sentido Zona Sul.

Sávio gosta das areias de Copacabana.

Os pombos também, aliás.

Enfim.

O fato é que ele esperava pelo trem de luzes vermelhas, que segue viagem até a Barra.

Mais uma vez, o Spotify agiu em conluio com o horóscopo.

O distante barulho dos trilhos chamou a atenção de quem estava à espera do metrô.

Sávio não escutou: fones nos ouvidos.

Quando a composição surgiu na estação, olhou de relance e não viu ninguém se apressando ao limiar da linha amarela.

"Ah. Esse deve ser o Botafogo", pensou, e voltou os olhos à playlist The Best of Miles Davis.

Minutos depois, o metrô já tinha deixado a estação.

E outro já se aproximava.

"É esse".

Educado, esperou os passageiros desembarcarem e acomodou-se num assento no meio do vagão.

Saviamente, não prestou atenção a mais nada.

Luzes se apagam.

Um segurança gesticula da porta.

Sávio tira um dos fones.

– Você tem que descer aqui! O ponto final desse trem é aqui! – alerta o homem.

"Merda. Esse é o da luz verde".

E era.

O de luz vermelha havia sido o anterior.

Sávio ficou puto.

"Vou a pé, foda-se".

Saiu do metrô.

O caminho era passar pelo Túnel Velho e, dali, seguir até a praia.

Assim, recolocou seus fones e pôs-se a subir a Voluntários da Pátria.

Virou na São João Batista.

E, de repente, estava na frente do túmulo de Carmen Miranda.

* Marcos Luca Valentim é jornalista, cronista e poeta

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