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Anderson Silva

  • Foto do escritor: Antonio Augusto Brito
    Antonio Augusto Brito
  • 18 de jul. de 2017
  • 3 min de leitura

CURTA BOTAFOGO

O Max é mesmo um sujeito peculiar.

Aos 5 anos, inventou de produzir sua própria comunidade.

De formigas.

Na mão grande, fez-se dono de um cilíndrico estojo transparente onde sua mãe guardava bijuterias.

E, lá, punha, com certo denodo e um punhado de carinho, qualquer formiga que sua vista informasse.

Corre à boca miúda que, num período de seis meses, Max havia forçado mais de 500 formigas a dividirem o estojo.

No início do sétimo mês, Guto jogou tudo pela descarga.

O irmão mais novo se respaldou na barra da saia da mãe para fugir da fúria de Max.

E aí, lá pros 8 anos, quando voltou da casa dos avós em Sobrália, numa roça pra dentro de Minas Gerais, trouxe consigo um galo.

Conseguiu esconder da mãe e do Guto por três dias.

Como?

A mãe passava o dia trabalhando; Guto ficava na avó.

Max voltava da escola e tinha a tarde inteira com o tal galo.

Botava a ave pra dormir no cesto de roupa suja.

Mas certa vez o bicho se fartou de cheirar cueca e, na calada da noite, invadiu a cama da mãe.

O galo da madrugada acabou indo pra rua, e Max ficou de castigo até sabe-se lá quando.

Dizem que foram dois meses sem poder ir jogar gude com os melequentos da rua.

Tempos depois, o garoto ainda inventou de ter um golfinho.

Mas essa história fica para outra terça-feira.

O Max é mesmo um sujeito peculiar.

Agora, 27 anos, já casado, o rapaz se abriga na Marquês de Olinda.

Mudou-se há duas semanas.

Na primeira faxina na casa, notou duas pequenas aranhas numa sedosa teia localizada no canto superior do banheiro.

No box.

Pensou duas vezes em tirá-las de lá - afinal, Cíntia (sua esposa) teria uma síncope caso dezesseis patas se juntassem para tomar banho com ela.

Mas...

O Max é mesmo um sujeito peculiar.

A maior - ou, pelo menos, aquela que ele julgava ser maior - recebeu o nome de Anderson; a menor, Silva.

Uma clara alusão a um dos maiores lutadores de MMA da história.

Ontem, Max chegou do trabalho tarde, por volta de 23h.

Cíntia já dormia.

No fogão, deixara arroz, batatas e cenoura.

A carne, descongelada em cima da pia.

A mulher é vegetariana.

Preguiça em carne e osso, Max jogou óleo na frigideira e, lá, tacou uns bifes displicentemente cortados.

Foi ao banheiro lavar as mãos.

E flagrou um ato lindo: o banquete de Anderson e Silva.

Numa ponta da teia, Anderson mexia as patas dianteiras em alucinada velocidade, envolvendo algum inseto de menor porte que Max não conseguiu identificar.

Ele, então, correu para a dispensa, pegou a escada e voltou ao banheiro para acompanhar de perto o processo.

Meteu a cara a dez centímetros da ação.

Era uma mosca que agonizava na seda da morte.

Enquanto Anderson preparava a ceia, Silva contemplava o ato da outra ponta da teia, estático.

Max estava maravilhado.

Nem Discovery Channel tem tanta riqueza de detalhes.

Anderson parou.

A mosca estava imóvel.

Silva começa a se aproximar.

É chegada a hora do banquete!

Eis que o olfato denuncia o ululante: os bifes estavam queimando na frigideira.

Max se atirou da escada e correu para a cozinha.

Já era.

Perda total no rango.

O alarme de incêndio do apartamento soou.

Barulho infernal.

Cíntia acordou.

– O que tá acontecendo, Max? – apareceu Cíntia, mão no rosto protegendo a sonolência da luz.

– Nada, amor. Queimei a carne aqui, volta a dormir – respondeu, enquanto desativava o alarme.

– Por que a escada está no banheiro?

– Porra! Perdi!

Max voou para sua posição de espectador, mas também já era tarde demais.

A mosca já não estava mais lá.

Anderson e Silva já tinham jantado.

– Max! O que tu tá fazendo aí?

Cíntia se aproximou e, junto a um grito de horror, lançou um chinelo na direção dos recém-alimentados.

– Que porra é essa, Cíntia?! Pra que isso?!

– Tu tá maluco?! Cheio de aranha na casa e tu com a cara enfiada aí?! Eu, hein...

Voltou para o quarto e se deitou.

Max olhou as duas aranhas estateladas perto do ralo por alguns instantes.

Colocou-as no cantinho do box e foi fazer um miojo.

Marcou o enterro para hoje cedo.

O Max é mesmo um cara peculiar.

Quando acordou, Cíntia já tinha ido trabalhar.

Anderson e Silva já não estavam lá.

Um bilhete na pia.

"Se eu encontrar alguma outra aranha nessa casa, o chinelo vai voar em você. Te amo. Obs: compra carne".

Desolado, Max tomou banho e saiu para o trabalho.

Na volta, comprou carne moída.

* Marcos Luca Valentim é jornalista, cronista e poeta

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