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Licença poética

  • Foto do escritor: Antonio Augusto Brito
    Antonio Augusto Brito
  • 27 de jun. de 2017
  • 2 min de leitura

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Eu estava sentado (lê-se jogado) no chão do quarto de hóspedes da casa da minha avó, me perdendo entre dezenas de peças de Lego.

Ela morava ali no 127 da Voluntários da Pátria, no apartamento onde hoje reside minha mãe.

Tocou o telefone.

– Luca, é seu pai! – berra, de modo inconfundível, vovó.

Jogo tudo pro alto e saio correndo.

– Oi, pai!

– Meu filho, tudo bem? Sua tia Laura quer falar com você.

– Tá bom.

– Oi, Luquinha! É tia Laura.

– Oi, tia!

– Preciso falar com você uma coisa muito séria...

Na cabeça de um moleque, aquele timbre de voz antecedia um assunto sombrio: boletim escolar.

Me tremi da cabeça aos pés.

– O que foi, tia?

– Você quer ser padrinho da sua prima que vai nascer?

– Oi?

– Sua tia Christina vai ser a madrinha da Isadora, e eu quero que você seja o padrinho.

Eu tinha – e, graças a Deus, ainda tenho – padrinho, mas não fazia muita ideia do que significava SER um.

Mas eu amava – e ainda amo – a tia Christina.

E, se ela estava envolvida em alguma coisa, não tinha como ser ruim.

– Tá, eu vou ser padrinho da Isadora!

– Olha lá, hein, Luquinha... Confio em você, mas é muita responsabilidade...

– Eu quero!

A partir dali, confesso, a memória já me falha.

Não lembro como correu o resto daquele dia.

Não sei como terminou a conversa e nem se voltei às minhas construções no Lego.

Abro parênteses: eu era, aliás, um mestre da engenharia naquele troço. Sério, prodígio sinistro.

Mas lembro muito bem que, passados alguns meses, nasceu Isadora.

Precisamente, há exatos 18 anos.

Batizamo-la, eu e tia Christina.

O novelo da vida foi se desenrolando, e eu me agarrava à linha crescida à medida que Dorinha dava os primeiros passos, as primeiras mordidas, as primeiras palavras.

O sentido de padrinho, que um garoto jamais poderia exprimir na sua genial imaturidade, foi se mostrando.

E eu tentando acompanhá-lo em meio à conturbada adolescência.

Falhei por vezes.

A distância entre Botafogo e Santíssimo jamais pode ser usada como desculpa.

E eu entendi isso.

Crescendo.

Crescendo com Isadora.

Agora, me valho da licença poética para fazer da coluna de hoje um manifesto de parabéns à minha amada afilhada.

E dizer que eu tinha razão: nada que envolve minha tia Christina pode ser ruim.

Te amo, Dorinha. Parabéns.

* Marcos Luca Valentim é jornalista, cronista e poeta

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