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A pena de Alencar

  • Foto do escritor: Antonio Augusto Brito
    Antonio Augusto Brito
  • 14 de dez. de 2017
  • 2 min de leitura

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Botafogo da Belle Époque / Foto: Augusto Malta (1906)

O Rio é metrópole repleta de contrastes e, por sua própria natureza, serve de prato cheio ao cronista – o que aliás é comum a toda grande cidade. Por aqui passaram os melhores do país e do mundo, que aqui viveram, fizeram laboratório e daqui retiraram – todos – o grosso de sua grande obra.

Vindo do Ceará, e mais conhecido como autor de romances – Senhora ou Lucíola, p. ex. –, José de Alencar também figura como um dos grandes cronistas da cidade do Rio de janeiro, embora desconhecido.

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Em conjunto de crônicas intitulado Ao correr da pena, Alencar discorreria sobre a cidade, dando ênfase ao bairro que então despontava no imaginário de consumo da elite do tempo. A partir desta perspectiva, numa tardinha qualquer, era assim que o cronista via as possibilidades para o ócio da noite:

“No horizonte poético da bela sociedade já se lobriga um baile do cassino, uma regata em Botafogo, e algumas partidas familiares e encantadoras" (...).

Ah, quanta distância existe entre aqueles tempos e o nosso, em que, na visão de Alencar, sem maiores temores, “podíamos passear aos belos arrabaldes da cidade, a Botafogo, às Laranjeiras, ao Engenho Velho ou ao Andaraí (...)”, sem balas oficialmente perdidas e milícias fortemente armadas; tempos em que havia “na praia de Botafogo um magnífico boulevard como talvez não haja um em Paris, pelo que toca à natureza” e o bairro, naquele então, sobressaía e servia rutilantemente para “o rendez-vous da sociedade elegante da corte”.

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Parecia, inclusive, que a cidade era vocacionada para glamourizar-se também nos seus arredores, conforme relata o cronista: “Domingo passado o caminho de São Cristóvão rivalizava com os aristocráticos passeios da Glória, do Botafogo e São Clemente, no luxo e na concorrência, na animação e até na poeira”, ao referir-se à inauguração de suntuoso Jockey Club no bairro de São Cristóvão. Ou até mesmo uma expansão metropolitana maior, rumo à Serra, vista pelo cronista Alencar como grande alternativa balneária à saturação da Orla:

“De maneira que daqui a uns dez ou vinte anos, se as coisas continuarem, em vez de passar um domingo em Andaraí, Botafogo ou Jardim Botânico, iremos a Petrópolis, a Teresina, ou à Cidade dos Órgãos (...)”.

Contudo, num tempo em que para se estar antenado aos fatos, à moda e a tudo o que fosse moderno já não bastava o trottoir pelas ruas do Centro, o mito da Zona Sul começava a tomar corpo, e Botafogo é quem primeiro despontava como símbolo e estereótipo de um Rio que passou:

“Fostes sexta-feira à noite a Botafogo? Vistes como estava brilhante a linda praia, com a sua bela iluminação, com suas alegres serenatas, e com os bandos de moças que passeiam (...)?”.

*Lucio Valentim é professor de Literaturas, doutor em Letras Vernáculas e pesquisador visitante no Programa Avançado de Cultura Contemporânea (PACC) da UFRJ

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